Um desa-fio

Sabendo que um aluno apresenta muitas dificuldades em cruzar a linha média do corpo e que por esse facto poderá vir a ser um sério candidato a ver as suas escolhas - no que ao calçado respeita - reduzidas a palas e velcros, coloquei-lhe um desafio. Iniciámos uma actividade lúdica em que o objectivo (santa planificação) é que consiga cruzar fios - de acordo com um padrão -, dar nós e laços. Trata-se de um jogo de fio que para ele representa um enorme desa-fio. Como a repetição é uma chave determinante para esta aprendizagem, convenci a sua colega de carteira - rapariga jeitosa para ataduras - a alinhar numa estratégia de trabalho a pares. Fiquei convencido que viu ali uma hipótese de fundamento para uma candidatura ao excelente, pois sem pestanejar, aceitou com o olhar luminoso dos promovidos.

Ora bem... passaram cinco dias e hoje tive um diálogo com o nosso aprendiz:

-Fazendo gestos circulares com a mão-

Ele: Isto é um escândalo! Tens de a despedir!
Eu: Então? Que é que se passa? Tenho de despedi-la?!

Ele: A menina J.E. agora passa-me linhas e linhas desta riscalhada. Olha para isto! Parecem focinhos de coelho. Eu não tenho jeito para isto!
Eu: Então? Isso é para quê? Eu não lhe disse para fazer isso!...
Ele: Mas ela faz... e como eu não tenho muito jeito para isso, dá-me "fraco".
Eu: "Fraco"? Que disparate é esse?
Ele: A moça tá passada, pá! Agora tem a mania que é polícia e está-me sempre a ameaçar com essa riscalhada.
Eu: Mas eu combinei que era o jogo do fio e mais nada.
Ele: Mas ela não faz nada disso. Tens de a despedir. Tens de ir lá hoje! (referindo-se à sala de aula).
Eu: Eh pá! E não poderá ser amanhã?
Ele: Oh pá! Hoje é que era mesmo bom... isto é um escândalo!